22 de fevereiro de 2012

Uma Carta Aberta às Bandas de Louvor

James K. A. Smith*


Prezada banda de louvor,




Eu aprecio muito a sua disposição e desejo de oferecer seus dons a Deus em adoração. Eu aprecio sua devoção e celebro sua fidelidade - se arrastando para a igreja cedo, domingo após domingo, arranjando tempo para prática no meio da semana, aprendendo e escrevendo novas músicas, e muito mais. Como os artistas e artesãos qualificados que Deus usou para criar o tabernáculo (Êxodo 36), você está disposta a colocar seus dons artísticos em serviço ao Deus Triúno.



Então, por favor receba essa pequena missiva no espírito a que se destina: como um incentivo para refletir sobre a prática de "liderar a adoração". Parece-me que muitas vezes você é simplesmente cooptada para uma prática sem ser incentivada a refletir sobre a sua lógica, sua "razão". Em outras palavras, parece-me que muitas vezes você é recrutada para "liderar a adoração", sem muita oportunidade de fazer uma pausa e refletir sobre a natureza da "adoração" e o que significaria "liderar".



Em particular, a minha preocupação é que nós, da igreja, involuntariamente temos encorajado você a simplesmente importar práticas musicais para o culto cristão que - embora possam ser apropriadas em outros lugares - são prejudiciais para a adoração congregacional. Mais explicitamente, usando a linguagem que empreguei pela primeira vez em "Desejando o Reino", eu às vezes me preocupo que nós inconscientemente tenhamos encorajado você a importar certas formas de performance que são, com efeito, "liturgias seculares" e não apenas "métodos" neutros". Sem nos darmos conta, as práticas dominantes de performance nos treinam a nos relacionar com a música (e com músicos) de uma determinada maneira: como algo para o nosso prazer, como entretenimento, como uma experiência em grande parte passiva. A função e objetivo de música nessas "liturgias seculares" é muito diferente da função e objetivo da música no culto cristão.

Então deixe-me oferecer apenas alguns axiomas breves com a esperança de encorajar nova reflexão sobre a prática de "liderar a adoração":



1. Se nós, da congregação, não pudermos ouvir a nós mesmos, não é adoração. O culto cristão não é um concerto. Em um concerto (uma "forma de performance" particular), muitas vezes esperamos ser esmagados pelo som, particularmente em certos estilos de música. Em um show, chegamos a esperar esse tipo estranho de privação sensorial que acontece a partir de uma sobrecarga sensorial, quando o bater dos graves em nosso peito e no banho de música sobre a multidão nos deixa com a adrenalina de uma certa vertigem aural. E não há nada de errado com concertos! Só que o culto cristão não é um concerto. O culto cristão é uma prática coletiva, comunitária e congregacional - e o som reunido e a harmonia de uma congregação cantando como um é essencial para a prática da adoração. É uma maneira de "executar" a realidade de que, em Cristo, somos um só corpo. Mas isso requer que nós realmente sejamos capazes de ouvir a nós mesmos, e ouvir as nossas irmãs e irmãos cantando ao lado de nós. Quando o som amplificado do louvor da banda supera as vozes, não podemos ouvir-nos cantar - assim perdemos esse aspecto comunitário da congregação e somos estimulados a nos tornar efetivamente adoradores passivos, privados.



2. Se nós, da congregação, não podemos cantar junto, não é adoração. Em outras formas de performance musical, músicos e bandas vão querer improvisar e "ser criativos", oferecendo novas interpretações e exibir o seu virtuosismo com todos os tipos de trinados diferentes e pausas e improvisações sobre a música recebida. Mais uma vez, isso pode ser um aspecto delicioso de um concerto, mas no culto cristão significa apenas que nós, da congregação, não podemos acompanhar. E assim o seu virtuosismo dá origem à nossa passividade, a sua criatividade simplesmente encoraja o nosso silêncio. E enquanto você pode estar adorando com a sua criatividade, a mesma criatividade realmente desliga a música congregacional.



3. Se você, a banda de louvor, é o centro das atenções, não é adoração. Eu sei que geralmente não é sua culpa que nós colocamos você na frente da igreja. E eu sei que você quer modelar a adoração para imitarmos. Mas porque temos encorajado você a basicamente importar formas de performance da sala de concertos para o santuário, nós podemos não perceber que nós também involuntariamente encorajamos um senso de que você é o centro das atenções. E quando o seu desempenho torna-se uma exibição de seu virtuosismo - mesmo com a melhor das intenções - é difícil combater a tentação de fazer a banda de louvor o foco de nossa atenção. Quando a banda de louvor vai para riffs longos que você pode pretender oferecer a Deus, a congregação torna-se totalmente passiva e, porque adotamos hábitos de relacionar com a música do Grammy e dos palco de shows, sem querer fazemos de você o centro das atenções. Gostaria de saber se pode haver alguma reflexão intencional sobre o posicionamento (para o lado? Levando por trás?) e performance que pode nos ajudar a combater esses hábitos que trazemos conosco para adorar.

Por favor, considere estes pontos com cuidado e reconheça o que não estou dizendo. Isso não é apenas algum apelo em favor do culto "tradicional" e uma crítica do culto "contemporâneo". Não confunda isso como uma defesa de órgãos de tubos e uma crítica de guitarras e bateria (ou banjos e bandolins). Minha preocupação não é com estilo, mas com a forma: O que estamos tentando fazer quando nós "lideramos a adoração"? Se formos intencionais acerca da adoração como uma prática congregacional comunitária, que nos leva a um encontro dialógico com o Deus vivo - que a adoração não é meramente expressiva, mas também formativa - então podemos fazer isso com violoncelos ou guitarras de aço, órgãos de tubos ou tambores africanos.

Muito, muito mais poderia ser dito. Mas deixe-me parar por aqui, e por favor receba este como o incentivo que está destinado a ser. Eu adoraria vê-lo continuar a oferecer seus dons artísticos em adoração ao Deus Trino, que está nos ensinando uma nova canção.

Muito sinceramente,

Jamie

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*James K. A. Smith é professor de Filosofia no Calvin College.

Essa é uma tradução livre. Confira o original em 

Um comentário:

  1. O Voltemos também publicou:

    http://voltemosaoevangelho.com/blog/2012/08/james-k-a-smith-carta-aberta-aos-grupos-de-louvor/

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