18 de julho de 2009

Repensando a Hierarquia no Mundo

A Cabana certamente deve receber o crédito por apresentar uma tese ambiciosa e abrangente. Mas até que ponto devemos (ou podemos) rejeitar todas as hierarquias?

A pergunta "Como alguém se torna igual a Cristo?" é uma versão cristã de uma pergunta mais geral: "Como alguém se torna uma boa pessoa?". Esta pergunta tem há séculos preocupado os pensadores. Muitos daqueles que têm pensado sobre a formação ética descobriram ser tentador recorrer às regras, como se alguém pudesse ser ético simplesmente seguindo as regras certas. Mas uma abordagem da ética ou da santificação meramente baseada em regras é reducionista e legalista. Entretanto, será que por isso podemos concluir que as regras e a priorização das regras não têm lugar na vida do discipulado? Afinal, quando Jesus foi indagado sobre as prioridades, ele identificou duas prioridades: "Amarás ão Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e todo o teu entendimento" (Mateus 22:37) e "'Amarás o teu próximo como a ti mesmo.' Toda a Lei e os Profetas baseiam-se nestes dois mandamentos" (Mateus 22: 39-40). Por isso, parece que não podemos simplesmente falar na jornada para a santidade como um relacionamento com Jesus, pois essa jornada é dirigida por estes dois princípios.

E quanto à visão de A Cabana sobre a Igreja organizada? Aqui, acho que precisamos ser especialmente cuidadosos, pois, afinal, a concepção do livro sobre a Igreja não é tão revolucionária; na verdade, parece incrivelmente com um típico "Protestantismo da Baixa Igreja". Como disse George Marsden: "Uma das características notáveis de grande parte do evangelicalismo é o seu descaso pela Igreja institucional"*. Como outras rejeições da Igreja Institucional, encontramos aqui tanto críticas violentas quanto soluções explicitamente simplistas. É certamente correto dizer que a Igreja é uma pessoa em um relacionamento especial com Deus, com o próximo e com o mundo. Mas isso não requer que marginalizemos a expressão institucional da Igreja. Não é possível que o mesmo Deus que fala através de experiências carismáticas espontâneas e encontros comunais íntimos na sala de estar da casa de alguém possa também atuar através da beleza do Livro do Oração Comum da Igreja Anglicana, da liturgia mística da Igreja Ortodoxa Oriental e até mesmo do austero Colégio dos Cardeais da Igreja Católico Romana (juntamente com o papa!)? Pode ser que uma rejeição categórica da hierarquia institucional represente uma reação exagerada ao abuso de poder em favor de uma suposição ingênua de que "tudo o que você necessita é amor"?

Nossas indagações continuam quando passamos a considerar a hierarquia no Estado secular. Afinal, Paulo parece afirmar que o Estado é um poder comandado por Deus: "Que todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por Ele instituídas" (Romanos 13:1). E certamente não é segredo que Paulo fez bom uso da autoridade e do status que derivou de sua cidadania romana (ver Atos 16:37; 22:25,28). Na verdade, a condenação total das hierarquias de autoridade e submissão em A Cabana não deixa claro se é permitido aos cristãos servir na polícia ou nas forças militares, ou nos ramos do judiciário, legislativo ou executivo do governo. (Se toda participação for negada, então A Cabana enfrenta as mesmas fragilidades contra-culturais do clássico anabatismo.) Mais radicalmente, ela deixa o leitor pensando se deve haver uma governança secular ou se o livro na verdade defende a anarquia (literalmente: ausência de regras)!

Qualquer tentativa de ir além das estruturas de autoridade e submissão enfrenta um enorme problema: não vivemos em um mundo perfeito. A crianças ainda precisam ser corrigidas pelos pais, a polícia precisa conter a desobediência civil, e exércitos inteiros podem ser ainda necessários para restaurar a regra da lei. Em termos práticos, como a A Cabana propõe que vivamos neste mundo? É importante notar que o livro deixa aberta a possibilidade de participarmos destas estruturas falidas. Como diz Papai: "Nós trabalhamos dentro dos seus sistemas, ao mesmo tempo em que procuramos libertá-los deles" (113). Desse modo, pode ser que Papai defenda que os cristãos continuem a participar das estruturas de autoridade e submissão que dominan o cenário político, econômico e social. Entretanto, se essa participação é permitida, não o é sem obrigação; ao contrário, os cristãos devem participar das estruturas de poder falidas com a intenção e o objetivo de redimi-las a ponto de a hierarquia de poder não mais existir. Para dizer o mínimo, se esta concepção fosse seguida consistentemente, transformaria o cristianismo em um agente radical de mudança social e política.

Randal Rauser, Encontre Deus na Cabana, pp.77-80.

Randal Rauser é professor associado de História da Teologia do Taylor Seminary, Edmonton, Canadá.






"Se você alguma vez teve uma conversa sobre A Cabana, quer com um entusiasta ou um crítico, você vai querer convidar este teólogo qualificado e acessível para a conversa. Antes de você ter lido uma dúzia de páginas você vai saber porque é que precisamos de manter a companhia dos teólogos. Eles nos ajudam a manter as nossas conversas sobre Deus inteligentes, informadas, e pacíficas"

Eugene H. Peterson, Professor Emérito de Teologia Espiritual, Regent College, Vancouver, B.C.

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Para os comentários:

1- Você acredita que as hierarquias de poder no casamento, na Igreja e/ou na sociedade precisam ser rejeitadas ou que devam ser reformadas? Se escolher a última opção, como seriam as hierarquias realmente transformadas?

2- Você concorda que a essência da Igreja está no relacionamento pessoal? Que implicações tem essa visão para as estruturas institucionais tradicionais, ofícios, práticas e missões da Igreja?

16 de julho de 2009

Heresia em A Cabana?

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Por outro lado, tenho lido críticas sobre A Cabana, e algumas delas são muito injustas com o livro. Acusam-no de heresia, mas é evidente que o entenderam mal ou leram algo nele que não existe. Recomendo que os leitores encarem o livro com uma atitude de caridade e generosidade. É pena, mas alguns leitores cristãos pensam que é seu dever achar erro em quase tudo. A cabana contém certos erros, mas não encontrei nada que fosse flagrantemente herético.
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É importante não confundir imagem com doutrina. Só porque algumas das imagens usadas em A Cabana sejam não convencionais não significa que são heréticas. O autor deixa bem claro que não pensa que Deus Pai seja literalmente uma alegre mulher negra. E ele vai longe para deixar claro que Pai, Filho e Espírito Santo são um ser e três pessoas. Apesar da imagística utilizada em A Cabana, a doutrina da Trindade está claramente refletida nas palavras de Deus sobre si mesmo para Mack. Receio que alguns críticos não tenham distinguido apropriadamente imagística e doutrina quando criticaram o livro.
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Minha opinião é que não há nada de herético na doutrina implícita de A Cabana sobre a Trindade contanto que entendamos que a imagística é apenas isso -- imagística. A doutrina por atrás da imagística defende favoravelmente do Credo Niceno, o credo normativo da maioria dos ramos do Cristianismo, que afirma que Deus é "uma substância" e "três pessoas". A Cabana não utiliza essas palavras, e não deveria utilizar. É um romance escrito para o povo. Mas qualquer um que o ler com cuidado não pode acreditar seriamente que ele conflita com as Escrituras ou com o credo. Se alguém pensar assim, estará importando uma interpretação específica da Trindade que consta tanto na Bíblia quanto no credo. É muito comum dentre os caçadores de heresia. Eles tomam a sua própria interpretação estreita da doutrina e a colocam acima da Bíblia e do credo, e então acusam de heresia qualquer coisa que não combine com as suas interpretações. Mas está errado.

Uma avaliação cuidadosa da doutrina da Trindade de A Cabana é útil e justa. O livro pode ficar aquém de ser completo, e pode conter algumas distorções (ver capítulo três), mas não se pretende ser uma teologia sistemática. Para um romance, é uma adequada, se não particularmente iluminada, explicação da Trindade.
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Levando tudo isso em conta, considero muitas críticas à Cabana problemáticas. Ofereci minhas próprias críticas neste livro. Mas elas têm a ver com os elementos da história que podem ser mal interpretados. Uma coisa é a sugeria correções e outra é lançar acusações de heresia! Não encontro heresia em A Cabana, e me preocupo com as pessoas que pensam que encontram.

Vou ser claro mais uma vez. Se uma pessoa que acusa A Cabana de heresia perder explicar por que o livro não está exatamente de acordo com as normas doutrinais de uma determinada denominação, muito bem. Mas a maioria dos críticos não diz isso. Eles simplesmente colocam o rótulo de "heresia" no livro, o que não é justo, caridoso, nem mesmo cristão.

Roger E. Olson, Deus e a Cabana, pp. 178-185.

Roger E. Olson, PhD, é professor de teologia no George W. Truett Theological Seminary, na Baylor University, em Waco, Texas.
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Clique aqui para assistir a crítica de Mark Driscoll.

15 de julho de 2009

Não gosto muito de religiões

A opinião de A Cabana sobre religião, sistemas e instituições é ambígua. Ou seja, é difícil de interpretar. O autor lança esses dizeres de Jesus no ar, como pequenas granadas, e nos deixa imaginando o qu fazer com eles. Algumas pessoas poderiam considerar isso uma irresponsabilidade. Mas talvez sua principal preocupação não seja tanto nos convencer de alguma coisa quanto nos fazer pensar de formas novas e saudáveis. Vamos explorar o que ele poderia pretender.

Em primeiro lugar, A Cabana está tentando mudar nossa opinião sobre o que significa ser seguidor de Jesus e amigo de Deus. A maioria das pessoas acredita que essas coisas envolvem necessariamente um nível elevado de lealdade e participação em organizações religiosas. Crescemos pensando que a religião cristã é a nossa identidade primária. A Cabana está tentando diferenciar lealdade a Jesus e amor aos nossos próximos, de um lado, de lealdade a organizações e sistemas humanos, de outro lado. E vai mais além do que isso. Significa que organizações e instituições religiosas podem muitas vezes nos atrapalhar em sermos seguidores fiéis de Jesus.

Por que muitas vezes colocamos a lealdade às instituições e organizações religiosas na frente de Jesus? A Cabana diz que isso ocorre porque almejamos a certeza e a segurança que pensamos que as instituições e os sistemas, como regras, podem oferecer. O Deus de A Cabana quer que abramos mão da nossa mania de certeza e de segurança, e que na fé nos lancemos a ele em total confiança. (A Cabana tem até Deus dizendo para Mack: "Eu gosto demais da incerteza" [p. 190]. Que enigmático!) Isso significa que todas as instituições, organizações e sistemas são ruins? Não necessariamente. Mas, segundo A Cabana, eles se transformam facilmente em substitutos para Deus à medida que esperamos mais neles do que em Deus. Deus fala para Mack que os sistemas humanos não podem nos oferecer segurança (p.166). Só Deus pode fazer isso, e é uma questão de confiança radical, mais do que provação, segurança ou estabilidade. Sistemas e instituições podem oferecer tais coisas em certa escala, mas não podem substituir a segurança que encontramos confiando apenas em Deus e tendo um relacionamento com ele.

Assim, de acordo com A Cabana, os cristãos tendem a pensar incorretamente sobre ser um seguidor de Jesus. Consideramos que seguir Jesus é praticar atividade religiosa nas instituições humanas que abraçam algum sistema de doutrina e moralidade humanamente criado. Alguns ainda o identificam com lealdade ao partido político ou a certa ideologia. Está tudo errado. Podemos estar envolvidos em instituições que trabalham em nome de Deus no mundo, e podemos acreditar em doutrinas, mas temos de ser cautelosos em relação a elas e guardá-las livremente. É muito fácil se tornarem corruptas, mortas, irrelevantes ou abusivas. Afinal de contas, são humanas. Mesmo o Cristianismo em si, como religião organizada, é uma invenção humana e, por conseguinte, sujeita ao fracasso.

Tudo isso me faz lembrar de um livro clássico do teólogo cristão Emil Brunner (1889-1966) intitulado The Misunderstanding of the Church [O mal-entendido da igreja]. Brunner alegou que a igreja não é uma instituição mesmo que assuma formas institucionais. A igreja deve sempre se distinguir dos seus aparatos e formas organizacionais, como fluxogramas, declarações doutrinais, cerimônias e monumentos. A verdadeiras igreja é a comunhão, daqueles que acreditam em Jesus e o seguem. Um contemporâneo de Brunner, Karl Barth (1886-1968) alegou que o cristianismo não é sequer uma religião! É o evangelho. Yong leva isso um passo adiante: ser seguidor de Jesus Cristo não significa ser membro de alguma igreja ou mesmo identificar a si mesmo como cristão. É somente confiar em Deus, encontrar a nossa segurança nele, e amar a ele e ao próximo incondicionalmente.

(...)

10 de julho de 2009

Deus e a Cabana

  • Em Deus e A Cabana, Roger E. Olson se aprofunda em importantes questões encontradas em A Cabana, como o perdão, o modo de agir de Deus, como Ele pode ser três pessoas em apenas uma e que diferença isso faz em nossa vida.

  • Editora: Thomas Nelson Brasil

  • Autor: ROGER E. OLSON, professor de Teologia no George W. Truett Theological Seminary, na Baylor University, Waco, Texas, EUA. É também editor da revista Christian Scholar's Review.

  • O autor e teólogo Randal Rauser nos leva a uma fantástica jornada através das páginas dessa emocionante história em Encontre Deus na Cabana e convida o leitor incrédulo. Descubra por que o livro A Cabana é considerado: "Um potencial para oferecer consolo inegável. (...) um final cheio de esperança." Revista Veja

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7 de julho de 2009

Casa do Senhor


Atravessei o saguão e fui ao encontro de João. Lá estava ele, diante do mural da nossa escola dominical, os olhos cravados nas letras garrafais que diziam, lá no alto: EU ME ALEGREI QUANDO ME DISSERAM: ENTREMOS NA CASA DO SENHOR.

- O que isso quer dizer? - ele perguntou, apontando as palavras com o indicador.

- Que devemos ficar felizes de estar na presença de Deus. - Sem querer, minha voz se elevou um pouco no fim da frase, fazendo com que minha resposta soasse mais como uma pergunta.

- Boa resposta. Por que essa frase está aqui?

- Para mostrar o compromisso missionário com a educação cristã - respondi, tentando demonstrar indiferença, mas sabendo que ele estava querendo chegar a algum lugar. Continuei: - Estamos procurando criar uma atmosfera em que as crianças gostem relamente de assistir às aulas.

- E "a casa do Senhor" é este prédio aqui? - Ele apontou para a construção.

Opa! Eu não estava gostando nada do rumno que a coisa estava tomando. Após uma pausa, respondi:

- Bom, é claro que todos nós sabemos que "casa do Senhor" é algo bem maior do que isso. - Estava desesperado para dar uma resposta correta, mas tive a desagradável sensação de não possuir nenhuma no meu arsenal.

- Mas o que pensam as pessoas que lêem isso?

- Provavelmente entendem que significa freqüentar a nossa igreja.

- E é isso que vocês desejam que elas pensem?

De novo ele deixou que o silêncio permanecesse por mais tempo do que eu era capaz de suportar.

- Imagino que sim.

- Vocês não percebem que o que há de mais precioso no Evangelho é que ele nos liberta da idéia de que Deus reside em um local determinado? Para os seguidores de Jesus essa notícia foi excelente. Não precisariam pensar num Deus que estaria encerrado no recesso do templo e apenas disponível para pessoas especiais em ocasiões especiais.

Havia um pouco de tristeza em sua voz, e ficamos calados durante algum tempo.

- E então, Jake, onde é a casa do Senhor?

- Somos nós. - De repente aquela inscrição me pareceu abosolutamente estúpida. Eu me perguntava se João sabia que ela havia sido idéia minha. Eu certamente não iria contar-lhe.

João suspirou.

- Você se lembra do que Estêvão disse pouco antes de o matarem a pedradas? "O Mais Alto não mora em casas feitas por mãos humanas." Foi aí que o atacaram, porque os fazia lembar o desafio de Jesus de destruir o templo e reconstruí-lo em três dias. As pessoas são muito sensíveis em relação aos seus prédios, principalmente quando acham que Deus habita neles.

Não falei nada. Só balancei a cabeça concordando.

Passagem do livro "Por que você não quer mais ir à igreja?" - Editora Sextante.

Para saber mais, visite o blog de divulgação: http://adeus-igreja.blogspot.com/

Veja imagens associadas às expressões:

House of the Lord
Casa do Senhor
Alegrei-me quando me disseram

5 de julho de 2009

O elemento espiritual

"Considerando que as gerações emergentes realmente desejam experimentar o que é espiritual, nossas reuniões de adoração não deveriam proporcionar o que elas desejam? Não deveriam ser momentos de ligação com Deus, para parar e respirar um pouco, para desacelerar o ritmo da vida e vivenciar um pouco de paz, dirigindo o foco para Deus, e exaltar o nome de Jesus?


Ouvi bastante coisa sobre a comunidade de Taizé em uma pequena cidade no leste da França. No verão, de 3 a 6 mil pessoas por semana comparecem para orar, cantar em meditação e obter renovação espiritual. Esses jovens vêm da Europa pós-cristã -- da Alemanha, da Itália, da Inglaterra e de outros lugares. E eles são atraídos às dezenas de milhares não para um show cristão do momento ou para um agitado acampamento de verão com jogos, piscina e atividades, mas para uma experiência de uma semana, cristocêntrica e contemplativa."


Dan Kimball, A Igreja Emergente, pp. 174-175

Atualmente, meu encanto acerca da comunidade de fé têm oscilado entre a simplicidade orgânica e a beleza sacramental. Ainda não sei para onde esses pensamentos vão me levar.

1 de julho de 2009

O Que é a Igreja?

"O que vem à nossa mente quando pensamos sobre a palavra igreja é a coisa mais importante que molda o nosso funcionamento como igreja." - Dan Kimball, A Igreja Emergente