22 de novembro de 2008

Escatologia: advertências e promessas, não prognosticações

Brian D. McLaren

Certa vez, ao ser perguntado pelos fariseus sobre quando viria o Reino de Deus, Jesus respondeu: "O reino de Deus não vem de modo visível, nem se dirá: 'Aqui está ele', ou 'Lá está', porque o Reino de Deus está entre vocês" (Lucas 17:20-21) (...)

A despeito desses alertas contra a especulação, algumas pessoas crêem que a Bíblia apresenta uma clara cronologia quanto ao futuro, e se deleitam em especular sobre como ela seria. Crêem que a história é, de certa forma, como um filme que já foi escrito e dirigido ou determinado na mente de Deus. Já foi filmado, editado e colocado no projetor, e estamos apenas assistindo à sua projeção. A Bíblia lhe forneceria um código para que saibam o que esperar durante o resto do filme. Aqueles que utilizam essa abordagem não estão necessariamente de acordo sobre como se deve interpretar a Bíblia em termos gerais ou sobre os ensinamentos de Jesus em particular, mas ao menos concordam que o futuro já está mais ou menos determinado.

Outros -- e eu me encontro entre eles, embora tenha nascido, sido criado e doutrinado por completo na abordagem anterior -- crêem que nem a Bíblia nem os ensinamentos de Jesus têm o propósito de nos fornecer uma cronologia quanto ao futuro. Dentro dessa nossa perspectiva, Deus planejou criar o universo tal qual os pais têm um filho: a criança recebe limites e orientação, mas também é livre para viver sua própria vida. Isso quer dizer que o futuro do universo não está determinado como se fosse um filme já filmado e que está apenas sendo passao para nós. Tampouco fora lançado à própria sorte como dados jogados sobre a mesa. Em vez disso, a criação divina está amadurecendo com liberdade e também com limites, sob o olhar atento de um pai cuidadoso. Portanto, o que encontramos na Bíblia e nos ensinamentos de Jesus não são prognosticações determinísticas ou diagramas esquemáticos quanto ao futuro, mas, antes, algo muito mais valioso: são as advertências e as promessas.

As advertências nos dizem que, se fizermos escolhas tolas ou injustas, conseqüências ruins virão em seguida. Os profetas, de Moisés a Jesus, dão esses tipos de advertências com freqüência. Seu propósito não é o de contar o futuro, mas o de mudar o futuro. Ao advertir o povo a respeito de conseqüências negativas futuras advindas de uma mau comportamento, a esperança maior dos profetas é a de que as suas predições quanto às calamidades não venham a se realizar. Esperam que os desastres sejam evitados pela advertência dada, de modo muito parecido como quando uma mãe adverte um filho que está atirando pedras: "Você está se divertindo agora, mas alguém sairá ferido!" Caso o filho compreenda sua advertência, irá parar de atirar pedras, e ninguém se machucará. Isso significa que sua advertência obteve sucesso -- muito embora o que foi por ela "predito" não tivesse vindo a ocorrer. (Foi exatamente isso o que aconteceu no livro de Jonas, no Antigo Testamento: o profeta predisse a destruição e Nínive; o povo de Nínive se arrependeu e portanto não foi destruído. A ironia, é claro, é que Jonas fica decepcionado, poir preferia que os ninivitas fossem incinerados!)

As promessas também diferem de prognosticações. Se digo para meus filhos: "Sempre estarei do lado de vocês", não estou fazendo um predição -- porque algum dia vou morrer e minha declaração deixará de ser verdadeira. Mas, considerada como uma promessa, minha declaração será verdadeira. Ou posso fazer uma promessa condicional: "Façam seus deveres de casa e os levo para jantar fora." Não estou predizendo o que vai acontecer. Estou, no entanto, prometendo fazer algo de acordo com minha capacidade, se meus filhos fizerem algo de acordo com seu senso de responsabilidade e de autorização, ajudando a desenvolvê-lo .

Prognosticações podem ter o efeito contrário. Seu seu fizer a predição: "Você fracassará não importa o quanto se esforce", você não ficará muito motivado a tentar. Irá se sentir desesperado, paralisado e impotente. Se eu fizer a predição: "Você terá sucesso mesmo que não faça qualquer tentativa", também não se sentirá motivado a dar o seu melhor ou a se sacrificar heroicamente. Será tentado pela preguiça ou pela complacência. Por isso as prognosticações são traiçoeiras.

Quem lê as advertências e as promessas da Bíblia como prognosticações precisa calcular como irá distribuir as advertências e as promessas em ordem cronológica. (Não estou afirmando aqui que não existem predições na Bíblia, mas, antes, que muitas das passagens que comumente interpretamos como tal seriam mais bem interpretadas se vistas como advertências e promessas.) De maneira que sua esquematização quanto ao futuro pode ser advertência-advertência-promessa- advertência-promessa, ou ainda -advertência- advertência-advertência-promessa. Essas pessoas podem dizer que haverá um período incerto de tempo sob promessa, seguido de sete anos de advertência, seguido de mil anos de promessa, vindo depois outra advertência, suguido por uma eternidade de promessa. Os arranjos possíveis são infinitos.

No entanto, se entendermos o texto bíblico menos como prognosticação e mais como advertências e promessas dirigidas a seus ouvintes originais, teremos um cenário muito mais simples: nós, seres humanos, viveremos com as sempre presentes advertências e promessas, tendo a derradeira advertência de que o mal e a injustiça perderão e a derradeira promessa de que Deus e o bem vencerão. O objetivo não é o de nos colocar em um universo fatalista e determinista que nos leva a sucumbir a imbatíveis desautorização, fatalismo, desespero ou resignação. Ou não se trata também de sermos lançados a uma confiança excessiva, complacente, arrogante ou triunfalista. Pelo contrário, advertências e promessas servem para elevar nosso senso de responsabilidade e de compromisso, e também para nos alertar -- assim como no caso das crianças atirando pedras -- para que percebamos que conseqüências muito sérias podem ser ocasionadas em função de nossa negligência ou desconsideração. Se crermos nas promessas e nas advertências, não iremos persistir em fazer o mal ou em permanecer complacentes, porém persistir em fazer o bem e em darmos frutos, mesmo quando for difícil.

Para mais sobre essa abordagem à profecia bíblica, ver, de Craig Hill, O Tempo de Deus: A Bíblia e o Futuro (Viçosa-MG, Ultimato, 2004), e, de Walter Brueggemann, The Prophetic Imagination).

Fonte:
Mensagem Secreta de Jesus, A. Publicado por Thomas Nelson Brasil

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